Para quem tudo vê qual a metáfora do copo meio vazio, foi um recuo. Todavia, não precisa ser áulico para enxergar na meia volta do governo estadual um gesto de grandeza ou, ao cabo e ao fim, em se tratando do desgaste que causou, a visualização metafórica do que se anuncia como o fim da crise e a imagem do copo meio cheio.
O fato político é que o governador Helder Barbalho, após mais de três semanas sendo obrigado a assistir a ocupação por povos indígenas da Secretaria de Estado de Educação do Pará (Seduc), enviou nesta quarta-feira, 05, um Projeto de Lei (PL) à Assembleia Legislativa do Estado (Alepa), cujo objeto é a revogação da Lei 10.820, aquela que propunha alterações na educação indígena.
Nesses mais de vinte dias, cerca de cento e cinquenta manifestantes de dez povos diferentes estiveram no centro da ocupação da Seduc.
Em verdade, a alteração no texto da Lei 10.820, de 19 de dezembro de 2024, que provocou toda a polêmica e tratava da carreira do magistério no Pará, dizia respeito ao capítulo que previa a substituição do ensino presencial por educação a distância (EAD) nas escolas de áreas remotas, tipo as terras indígenas, e de outras comunidades, como as quilombolas.
Sobre a questão, Helder Barbalho afirmou que houve “muitos ruídos de comunicação e dificuldades”, mas que era hora de “valorizar a capacidade do entendimento recíproco” para que se possa apontar soluções que garantam educação estadual de qualidade.
SOMEI e omissão
Dois aspectos devem ser observados em toda a polêmica e desgaste para o executivo estadual:
Primeiro, o texto da lei publicada no final de 2024 não falava ou esclarecia nada sobre o funcionamento do Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (SOMEI), responsável por garantir aulas presenciais;
Segundo e ainda mais delicado foi a contrariedade das comunidades indígenas que se mostraram categoricamente contrárias à substituição das aulas presenciais pelo EAD.
Termo de Compromisso
A reunião em que foi anunciado o projeto de revogação contou com a assinatura do “Termo de Compromisso” que cria um grupo de trabalho formado, além dos indígenas e de representantes do executivo estadual, por membros do Sindicato dos Trabalhadores da Educação (Sintepp), e das comunidades quilombolas, ribeirinhas e das populações tradicionais.
Objetivo
O objetivo do grupo será discutir e elaborar um PL que institua o “Estatuto do Magistério e Plano de Cargos, Carreiras e Salário” dos profissionais públicos da educação básica paraense.
Ação no STF
Durante a ocupação, a ONG Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei 10.820/2024.
Segundo a entidade, com a lei, o ensino indígena “desapareceu da legislação estadual”.
O presidente da Corte Suprema, ministro Luís Roberto Barroso, julgou que o tema não era urgente e o projeto foi enviado à ministra Cármen Lúcia.
Em seu despacho nesta terça-feira, 04, a magistrada deu cinco dias para que o governador se manifestasse sobre a sanção da lei.
Cármen Lúcia cobrou ainda posicionamentos sobre a questão da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Advocacia-Geral da União (AGU).
Desocupação
Após a divulgação da proposta de revogação, os indígenas ficaram de deliberar sobre a desocupação da Seduc, invadida na terça-feira, 14 de janeiro.
Conciliação, Alepa e MPPA
Além de parlamentares, da vice-governadora Hanna Ghassan, de representantes das comunidades e do Sintepp, o presidente da Alepa, deputado Chicão (MDB), e o procurador-geral de Justiça César Mattar Jr., também participaram da reunião conciliatória.
Ao presidente em terceiro mandato do Legislativo estadual é creditada uma solução, a saída do imbróglio responsável por causar um desgaste pelo qual fazia tempo que Barbalho, um dos governantes mais bem avaliados do Brasil, não purgava.
Avante.